Gustavo Freitas

Nome Gustavo Freitas

Idade 29 anos

Instituição Universidade de Coimbra

Área de investigação Jornalismo e Crítica Pós-colonial

Como começou o teu percurso como investigador? Algum acontecimento ou evento particular suscitou o teu interesse pela área da investigação que atualmente desenvolves?

Acredito que meu percurso como investigador começou propriamente com a mudança para Portugal, em 2018, quando passei a dedicar-me exclusivamente à atividade académica.

Eu me formei em Comunicação Social em 2015, mas desde 2013 já trabalhava como assessor de comunicação. Em 2016 assumi mais um trabalho e comecei a me dividir entre a assessoria e o jornalismo de turismo, o que é permitido e muito comum na realidade brasileira, especialmente num ambiente de precarização que vem se alargando. Em meio a isso, tentava de alguma forma me manter conectado com os estudos e consegui, em 2017, concluir uma pós-graduação em Filosofia e Direitos Humanos. E foi nessa pós que me convenci a voltar para a universidade, sendo a minha primeira intenção ingressar num mestrado em Filosofia.

Após algumas orientações valiosas, decidi que me manteria na Comunicação e o programa de Coimbra me interessou logo de cara, especialmente pelas disciplinas lecionadas pela professora Maria João Silveirinha que, hoje, é uma das minha orientadoras e grandes referências. Inclusive, lembro-me com muita clareza de ouvi-la dizer, na primeira aula que tive com ela, que nós, brasileiros, não deveríamos nos preocupar com a nossa forma de escrever, que cada um escreveria com o seu português. E eu me senti verdadeiramente acolhido, especialmente, estando naquela época a morar numa casa com mais dez brasileiros que, em sua maioria, relatavam exatamente o contrário: preconceito com o nosso registo.

Essa e tantas outras situações que soube, que li sobre, que vivi, que testemunhei foram alimentando em mim uma necessidade de me integrar nos debates acerca das reminiscências coloniais. Ao estudar as representações de atores políticos no mestrado, também percebi que entre tantos outros há um “outro” que constitui-se a partir da diferenciação construída entre o nós e o eles, em que esse “eles” somos nós, os brasileiros, os guineenses, os angolanos e os demais falantes do português que não é o português europeu, e que isso vai servindo para sustentar uma diferença que depois é reforçada por outros pontos, como género, raça, classe, orientação sexual e um sem-fim de frutos do empreendimento colonial.

Em suma, sinto-me empolgado em continuar na investigação e percebo que os caminhos que tenho trilhado nesse sentido têm sempre me levado ao debate pós-colonial.

Podes apresentar-nos um pouco da tua produção científica enquanto investigador?

Tenho me dedicado especialmente ao estudo das representações. No doutoramento, de modo especial, busco compreender como a imprensa portuguesa produz sentidos e alimenta a memória coletiva no que diz respeito ao colonialismo. Nesse processo, também vou percebendo que há muito por aprender antes de empreitar um trabalho de análise, como as diferentes dinâmicas coloniais entre Portugal e as ex-colónias, os diferentes processos de independência, as diferentes reivindicações, as influências da Europa na abordagem dessa temática e no interesse sobre ela, o desenvolvimento desse tema na investigação espanhola, britânica, francesa… enfim, sinto-me num ritmo slow science especialmente pela necessidade de desenvolver uma sensibilidade e adquirir um aprendizado imprescindíveis ao trabalho que quero apresentar.

Tens sido especialmente influenciado por algum/a autor/a e/ou tradição teórica?

Certamente a professora Rita Basílio de Simões, minha orientadora no mestrado e também no doutoramento, é a principal responsável pelo meu interesse e pelo que já sei sobre representações, produções de sentido e dinâmicas discursivas. Já a professora Maria João Silveirinha é muito responsável pela minha inquietação com as dinâmicas sociais, muito além das questões de gênero, que é seu principal campo de atuação. E nas muitas trocas que já tivemos durante o mestrado e o doutoramento, descobrimos uma grande admiração em comum, que é pelo Stuart Hall – uma referência importantíssima tanto para a comunicação quanto para os Estudos Pós-coloniais. Eu me inspiro muito no Hall, por ele ter sido um homem que nasceu numa ex-colónia e construiu um inquestionável legado contra-colonial na terra do colonizador, também por ser um teórico que produziu sobre diferentes temas, conseguindo observar a importância de fenómenos menosprezados e/ou subestimados, inclusive. Se pegarmos a coletânea Writings on Media, lá teremos críticas sobre produção televisiva, representações fotográficas, colonialismo e… colunas de fofoca, o que demonstra que podemos ter interesse sobre muitas frentes e que todas essas frentes podem constituir-se como importantes investidoras de sentido.

Qual foi o ponto de partida para o projeto de doutoramento que desenvolves? Fala-nos um pouco sobre ele.

O meu projeto de doutoramento centra-se no estudo das representações do colonialismo e da lusofonia nos diários portugueses, tendo como recorte temporal os 25 anos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (1996-2021). Estou na fase de exploração do corpus e estruturação do processo de entrevistas. Acho que já dei muitas pistas sobre como cheguei até esse tema, mas, ao compreender no mestrado que às deputadas negras era dado um tratamento diferenciado por parte dos media, independentemente da performance delas, ressalto que acredito na importância de perceber como as memórias acerca do colonialismo são alimentadas contemporaneamente no âmbito jornalístico.

Quais os principais desafios que encontraste no doutoramento e/ou no percurso enquanto investigador? Que estratégias adotaste para responder a tais desafios?

Acredito que meus maiores desafios se deram no mestrado. Foi quando entendi o que é ser investigador, como já disse. Para mim, foi mesmo um período muito difícil e que se encerrou em meio à pandemia, perda de prazos e enfrentamento de muitos problemas pessoais. Depois de passar por tudo isso, ao ingressar no doutoramento e conseguir financiamento da FCT já no primeiro ano, vejo meu caminho no doutoramento como um caminho de colheitas e aprendizados prazerosos, por mais cansativo e precário – e até mesmo injusto – que às vezes possa ser. O fato de termos voltado do teletrabalho, de poder vir estudar na Biblioteca Geral, ver meus amigos e colegas, ter boas conversas – por vezes muito importantes pro amadurecimento da investigação e meu próprio – também é um ponto muito positivo.

Durante a frequência do doutoramento, algum aspecto te surpreendeu positivamente? E negativamente? 

Foi durante o doutoramento que comecei a me inserir em redes de investigadores, como o GT, a circular pelos espaços de produção e troca de conhecimento, a entender melhor a realidade da investigação em Portugal. Portanto, o doutoramento para mim foi como um abrir de portas para novas experiências, oportunidades e responsabilidades já com muita consciência.

Atualmente, dedicas-te exclusivamente à investigação?

Sim. Especialmente por conta das implicâncias do financiamento da minha pesquisa. Mas tenho procurado me envolver em atividades que vão me ajudando a evoluir academicamente. Cito o meu envolvimento com as nossas Jornadas de Ciências da Comunicação FLUC, minhas colaborações como o GT, aulas que vou tendo em outros cursos, estudo de línguas e atividades que também busco para manter a rotina minimamente mais dinâmica, pois sou muito inquieto (ou, melhor dizendo, um mercurial thinker).

Como é que organizas o teu dia a dia de trabalho com a vida quotidiana?

Mantenho uma rotina de estudos na Biblioteca Geral. Para onde costumo ir todos os dias de segunda a sexta-feira. O fato da biblioteca fechar aos fins de semana me ajuda a organizar a minha vida no sentido de conseguir estudar em casa quando necessário mas também não tornar a minha casa no meu lugar de fazer tudo – ao que fomos levados durante a pandemia. O próprio ir e voltar, que me permite ver o meu bairro, passar pela cidade, ver pessoas, o ir e vir dos estudantes são coisas que me distraem mesmo em períodos mais intensos e que ajudam no distanciamento necessário das atividades a que nos dedicamos para depois poder voltar a elas com outros olhares e, assim, ser possível ir melhorando.

Imaginas o teu futuro ligado à investigação ou gostavas de conhecer outras áreas e enveredar por outros caminhos?

Mesmo com os problemas que enfrentamos na ciência, eu gosto do ambiente académico e me vejo a desenvolver diferentes atividades nesse universo. A organização de eventos científicos e a sala de aula, por exemplo, são atividades que me interessam bastante.

Por que motivo participas no GT de Jovens Investigadores da Sopcom e o que mais gostas neste grupo? (Se te sentires confortável, pedia-te que respondesses também em vídeo a esta questão)

O GT me motiva, me acolhe e talvez me faça cada vez mais sentir-me um investigador. É especialmente através do GT que conheço investigadores que gosto e admiro, profissional e pessoalmente, e percebo o nosso grupo como um ambiente em que os jovens investigadores não somente partilham seus dilemas mas também se ajudam, se incentivam e, juntos constroem oportunidades de crescimento para todos.

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